SÃO JOSÉ DO CALÇADO/ES
Parece que os eleitores de Zé Carlos (PMDB) intuíram que só uma vitória com uma grande margem de diferença seria condicionante para que ele assumisse. Bingo, vai assumir.
Condenado à perda do mandato decidida pela Câmara na sua primeira administração (se não me engano em 2011), com o detalhe de que naquela oportunidade o presidente da “Casa Cassadora” era o seu atual vice-prefeito Teté, Zé Carlos teve o recurso deferido pelo TRE/ES, que contrariou argumentação interposta pelo segundo colocado Cuíca. No entendimento da corte, a cassação que foi chancelada em 1ª instância do Judiciário não previa a perda dos direitos políticos.
Por que digo que a opinião pública pode ter influenciado a tomada de decisão dos doutos juízes? Insinuo, acaso, que suas excelências foram parciais? Que saltitaram nas botinas com solas de tachinhas em cima das leis e da Constituição? Não. Coloquemos de outra maneira: numa democracia, a vontade da maioria é soberana. E quanto mais expressiva essa maioria, mais soberana tende a ser sua vontade.
Decisões judiciais não advêm de ciências exatas como a Lei da Gravidade, que independentemente de quem vê, de onde vê, da hora que vê, os corpos caem inapelavelmente.
No Direito, a coisa é mais subjetiva, sujeita a interpretações de pessoas com conceitos e entendimentos os mais diversos, ainda que numa assembleia de vestais. Fosse diferente, não existiriam recursos, advogados, erros jurídicos, coisa e tal. E mesmo as togas em plenários refrigerados não estão imunes às emanações quentes das urnas, cuja influência pode ser sutil, imperceptível, por osmose.
A diferença de Zé Carlos para Cuíca (PDT) foi grande. Tão grande que se o município tivesse hipoteticamente mais de 200 mil habitantes, e fosse proporcionalmente projetada sua performance, Zé Carlos precisaria de meros 0,7% a mais de votos válidos para levar no primeiro turno.
Ele ganhou de Cuíca por 3.584 x 2012. Foram 49,3% contra 27.7% dos 7261 votos válidos (os demais candidatos, professor Ciro - PV e Bodoque – PROS obtiveram respectivamente 1489 e 176). Portanto, Zé Carlos assume, acima de tudo, com a legitimidade das urnas e com as bênçãos do PMDB do governador Paulo Hartung, que é diferente do de Cabral, Pezão e Paes, no RJ (e pesadelo de Sávio Saboia em Bom Jesus do Itabapoana/RJ).
O que faltou a Cuíca foi o entendimento contrário da Justiça, claro, que indeferiu suas aspirações. Mas tenho pra mim que se ele tivesse tido votos suficientes para reduzir a um tamanho ínfimo a derrota (como ocorreu, aliás, com o próprio Zé Carlos em 2008, quando ganhou de Alcemar Pimentel naquela oportunidade por exíguos 119 votos), a banda poderia ter tocado música diferente da “campeão, vencedor, ô, uô…”.
BOM JESUS DO NORTE/ES
Aqui, o esperado. Se a família do ex-prefeito, ex-deputado estadual e ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado, Umberto Messias, é osso duro de roer desde tempos imemoriais, com o reforço de uma ala dos Batistas, que tem o médico Tadeu como seu mais ilustre componente da política, a candidatura de Marquinhos Messias (PSD), filho de Umberto, era pule de 10.
Ganhou com 2502 votos, contra 1777 do segundo colocado Toninho Gualhano (PCdoB), e 1118 de Marcão (PMDB), o terceiro. Em seguida, Salatiel de Oliveira, do PHS, com 162; Aluizio Teixeira, do PSDC, com 102 e Fabinho do Maneco, PRB, com 52. Destaque negativo para este último, que foi o candidato a prefeito menos votado entre todos os 78 municípios capixabas.
Não é certo, porém, relativizar o mérito do próprio Marquinhos, que demonstrou determinação em perseguir seus objetivos desde as eleições de 2008 quando perdeu para o Dr. Adson. Ali, sim, poder-se-ia presumir que, se ganhasse, teria sido por majoritária influência familiar, até porque, jovem demais, era inexpressivo e inexperiente.
Mas soube transformar aquele infortúnio angariando apoio constante e gradual, e como vice do tio (o atual prefeito Ubaldo Martins, irmão de Umberto) nas eleições de 2012, ganhou também certa experiência executiva, muito embora, desde a posse em 2013, vem fazendo pouco “barulho”, talvez pela própria característica da função de vice no sistema político brasileiro, que é quase ao de uma figura decorativa, ou pelo temperamento um tanto discreto, ou por outro motivo qualquer.
Então, por que a relativa pequena diferença em relação ao segundo colocado, não obstante esse forte apoio? No meu entender isso não se deu apenas pela quantidade incomum de candidatos (cinco desta vez), mas por “fadiga de material”, sem olvidar a campanha aguerrida de Gualhano.
Ubaldo se manteve aparentemente neutro, mas essa defecção não seria por si só uma catástrofe porque a família é campeã absoluta na governança do município desde o início da década de 1980, que começou com o próprio Umberto. Este, por sua vez, fez o sucessor. Em 1992, Ubaldo se elegeu; em 2000, 2004 e 2012, idem, idem. Portanto, em oito ou nove mandatos desde então, se não me engano, seis foram dos Messias, sendo quatro somente com Ubaldo.
Este é um desafio para Marquinhos, que tem tudo para governar bem se tiver a vontade de sacudir uma estrutura monótona sem divorciar-se da experiência familiar, notadamente a capacidade de aglutinação, a expertise política. Não por acaso sua vice é uma Batista (a professora Angélica), sobrenome que em tempos pretéritos vivia às turras com os atuais companheiros.
Umberto foi reconhecidamente um bom administrador. Ubaldo também, especialmente na gestão dos recursos. Em seus sucessivos governos, salários e obrigações com fornecedores não sofreram grandes abalos. É também um “amante das pedras”, proporcionando calçamento de logradouros em quantidade exponencial.
Em outros quesitos, vale lembrar que, no Estado, Bom Jesus do Norte é o município primeiro colocado no Ranking Nacional de Eficiência de Gestão, conforme pesquisa divulgada pela Folha de São Paulo em 26/8 do corrente. Por outro lado, enfrenta problemas de infraestrutura urbana. É um dos de mais alta densidade populacional, sintoma da reduzida extensão do território, um traçado urbano simplório e acanhado com a agravante de sua localização fronteiriça ao 2º maior estado da Federação, economicamente falando.
Sangue novo, ainda que com o mesmo DNA pode descortinar a solução dessa e de outras difíceis equações. Nas aeronaves, fadigas de material causam desastres. E a diferença de votos aquém das expectativas de Marquinhos em relação a Gualhano pode ter sido um aviso da necessidade de revisar conceitos para viabilizar voos mais longos com a segurança necessária.
APIACÁ/ES
A vitória de Fabrício do Posto (PP) em Apiacá/ES, que teve 2278 votos contra 1468 de Betinho Miranda (PMN) e 1253 do Dr. Roy (SD) foi resultante do sucesso da aglutinação das oposições.
Fabrício ganhou, mas quem também celebrou – e muito foi o ex-prefeito José Chierici e Kaká, ex-vice-prefeito do próprio Humberto Alves, o atual, na primeira gestão deste, que foi de fins de 2010 a 2012 (o eleito em 2008, José Chierici, foi cassado pela Justiça Eleitoral por compra de votos antes de completar dois anos de governo, cedendo a cadeira ao segundo colocado Humberto Alves de Souza – também de apelido Betinho, tal e qual o seu “afilhado” nesta última eleição, 2º colocado). Kaká inclusive emplacou sua mulher Rosane como vice de Fabrício.
Humberto Alves, depois de se eleger despertando em seus apoiadores a certeza de uma longeva parceria, deu um “cavalo de pau” em sua administração, de uns dois anos para cá. Demitiu secretários, entrou em rota de colisão com a Câmara, contrariou interesses poderosos e isso amplificou descontentamentos.
Além disso, sua retórica virulenta contra os oponentes, as catilinárias dirigidas principalmente ao grupo de José Chierici potencializaram a já normalmente feroz agressividade entre as facções. Os opositores, com as facas entre os dentes, consideravam uma questão de honra desbancar tão audacioso desafeto.
Deu certo. Embora Humberto Alves tenha gerenciado bem o município (pelo menos até que se prove o contrário), o envolvimento diário nas escaramuças tomou-lhe o tempo de fazer o que melhor ele sabe, que é a política no varejo. O discurso vivaz, grandiloquente, a maestria na enunciação de ideias, a perícia em manusear feitos e números, o sorriso franco, a maneira cativante com que dá um tapinha nas costas, um abraço de paquiderme, parece que foram sacrificados em prol das agressões aos adversários.
Também pesou o desgaste natural de uma gestão continuada, que Humberto tentou reverter mudando paradigmas políticos. Mas pesou a mão. No caso por exemplo de ter perdido a maioria na Câmara por, segundo ele, recusar-se a dar seu beneplácito às costumeiras demandas dos vereadores, e de sacrificar determinados grupos de pessoas para hastear a bandeira da austeridade, esperava que a população, de forma geral, refletisse isso nas urnas em favor de Miranda, o que não aconteceu.
BOM JESUS DO ITABAPOANA/RJ
Em Bom Jesus do Itabapoana, Roberto Tatu, do PR, partido do ex-governador Anthony Garotinho, venceu o candidato da situação Sávio Saboia (PMDB). Tatu teve 10.895 votos; Saboia, 7958. Em 3º, Paulo Portugal (PP), com 1987 e em 4º, Samuel Júnior (PHS), com 1386. O estigma do PMDB do Rio, que viu seu atual prefeito sofrer a humilhante situação de nem chegar ao 2º turno, fez vítima também por estas bandas.
E que se note: Anthony Garotinho, a maior estrela do PR, perdeu em 2014 a eleição para governador e agora perde em Campos dos Goytacazes, sua cidade natal. Atualmente dirigida por sua mulher Rosinha, pela segunda vez porque reeleita em 2012, ali a derrocada foi tão retumbante que seu candidato Dr. Chicão perdeu no primeiro turno para Rafael Diniz, do PPS. Mas teve em Bom Jesus do Itabapoana o prêmio de consolação, com Tatu, que foi apoiado também pelo ex-prefeito Paulo Sérgio Cyrillo, pai do vice eleito Cyrillo Filho.
Destaque na campanha de Tatu para o marketing bem planejado e executado pelo bom-jesuense Marcelinho Almeida, suporte importante para a vitória pela competência no uso das redes sociais, rádio e outras mídias. O vocabulário simples e objetivo atingiu o eleitor de maneira clara, tornando fácil a absorção das mensagens.
Mas de janeiro em diante é que a porca torce o rabo se não for cotó. O novo prefeito terá de se desdobrar para ao menos manter o município nas condições atuais. Tarefa árdua principalmente por força das condições econômicas do Estado do Rio.
Ele herda de Branca Motta uma gestão organizada, apesar dos pesares, constatação fundamentada, entre outros fatos, na reversão do caos administrativo que ela enfrentou em sua primeira gestão, com o detalhe de que naquela época o Brasil estava com sua economia “bombando”.
E Sávio Saboia foi um secretário de Cultura e de Saúde dos mais atuantes e realizadores, o que força Tatu a conseguir gente de igual capacidade ou, de preferência, maior.
Se manter essas condicionantes já será difícil, imagine a pressão que o novo governante sofrerá principalmente por parte dos servidores, há muitos anos sofrendo com ausência de reajustes e que depositaram suas esperanças em Tatu!
Vai ter que usar todo o vigor da juventude, a capacidade de trabalho, a força moral dos quase 3000 votos à frente de Saboia, firmemente unido com as forças que o apoiaram e com a simpatia do Poder Legislativo.
No entanto, tais dificuldades, se superadas, serão o princípio ativo do sucesso de sua carreira política. São em cenários assim que costumam destacar-se os verdadeiros líderes, e Tatu tem essa preciosa oportunidade.
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em novembro/2016