Pablo Neruda (1904-1973), escritor chileno, um dos mais consagrados poetas de todos os tempos, disse em seu livro autobiográfico 'Confesso que vivi': “A América Latina gosta muito da palavra esperança. Os candidatos a deputados, a senadores, a presidentes se autointitulam candidatos da esperança. Na realidade esta esperança é algo assim como o céu prometido, uma promessa de recompensa cujo cumprimento se adia. Adia-se para o próximo período legislativo, para o próximo ano ou para o próximo século”.
O comunismo, fragorosamente derrotado enquanto coisa séria, exigiria gente mais competente para fazê-lo reviver no Brasil, com os acessórios necessários aos tempos modernos. Até os tijolos que restaram do muro de Berlim como souvenirs devem estar horrorizados com essa cambada brasileira, com as figuras ridículas e desastradas de companheiros muy amigos.
Num outro trecho do livro, falando de González Videla, que governou o Chile no período 1946-1952, Pablo Neruda parece que escreveu na década de 70 do século passado com lupa no Brasil de hoje. Disse o poeta: “(...) logo renovou-se a esperança, Videla jurou fazer justiça e sua eloquência ativa lhe atraiu grande simpatia (...) mas os presidentes em nossa América criolla sofrem muitas vezes uma metamorfose extraordinária (...) rapidamente mudou de amigos (...) ligou sua família com a aristocracia e pouco a pouco converteu-se de demagogo em magnata (...)”.
Aliás, o Brasil talvez nunca tenha produzido tantos novos-ricos num período iniciado em 2003 sob o petismo, nem enriqueceu ainda mais os que já existiam, sobretudo nunca viveu tamanha discrepância entre o que lhe era acenado com o efetivamente concedido. Pior: nunca foi tão saqueado, tão roubado, tão vilipendiado! A traição se revela brutal, inacreditável, estarrecedora! Um povo que apostou todas as suas fichas na esperança vê-a inteiramente desvanecida. Acabou-se o que era doce, voltou à estaca zero, terá de começar tudo outra vez, esperando que pelo menos possa tirar algo de útil da crise, da latrina em que chafurdam empreiteiros e políticos da Lava-Jato, a bandalheira da hora que saqueou a Petrobrás deixando-a nos estertores.
Dos coliformes fecais, 'urinais e espermais' que são expelidos em cima do cândido e dócil povo brasileiro, só resta a este povo a esperança de que a pestilência fortaleça seu sistema imunológico e desencadeie um bombardeio químico contra os parasitas, para que não se perpetuem eternamente no pesadelo da bostandade em que se transformou a pátria outrora mãe gentil.
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado originalmente em março/2015