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31 de jan. de 2017

Ainda que vençamos, já perdemos



De uns tempos para cá estou meio indiferente pela Seleção Brasileira. Antes, como a esmagadora maioria dos brasileiros, deixava-me influenciar pelas cores vibrantes do escrete, pela alegria contagiante que ocorre em épocas de copas do mundo, associando-me aos carnavais fora de época que costumam despontar nesses junhos quadrienais.
Especialmente na juventude, a gente se integrava nas carreatas após as vitórias da Seleção. Observávamos as ruas coloridas, embandeiradas, a emoção coletiva à flor da pele, os vivas aos nossos craques, as discussões acaloradas sobre quem era melhor do que quem em cada posição nas equipes, o ódio quase mortal pelos rivais argentinos, etc., etc. Eu imaginava: se já é assim, quão retumbante seria se a Copa fosse realizada no Brasil!
E que decepção notar que tão arrebatadora expectativa se materializou num muxoxo coletivo, numa impassividade tamanha como se em 2014 a Copa esteja prestes a se iniciar no Círculo Polar Antártico..., sem a presença da Seleção Brasileira!
Continuo torcendo pelo Brasil, festejarei se vier o Hexa. Mas confesso que os argentinos já me são simpáticos. Então, se vier algum resultado adverso para o verde-louro da nossa flâmula, confesso que o receberei com a apatia dos renegados.
Este estado de ânimo, noto, no dia a dia, que é idêntico ao de milhões de brasileiros, que ao se gabaritarem numa escala maior de esclarecimento, do reconhecimento de que estão sendo manipulados, objetos de massa de manobras políticas rasteiras e inconfessáveis, ficaram  finalmente vacinados contra a hipocrisia e a dissimulação.
Instintivamente estamos dando uma banana portentosa àqueles que imaginaram que o circo mais galante do mundo dos esportes nos faria ainda mais agradecidos e conformados pelo pão nosso de cada dia, acomodado nas bolsas esmolas.
Pensaram, os insanos, que estádios faraônicos nos fariam esquecer a falta de leitos nos hospitais, a violência galopante, a falta de perspectivas no futuro, a Educação em frangalhos, a corrupção em dimensões planetárias. 
Em vez de mostrarmos coisas edificantes de nossa pátria, mostramos ao estrangeiro nossas piores mazelas, nossa falta de planejamento, obras inacabadas, infraestrutura caótica, uma demonstração melancólica de incompetência.
Que façam bom proveito do seu Titanic. Infelizmente, ainda que vençamos, já perdemos!


Por Ana Lúcia Guizardi - publ. originalmente em maio/14