De uns tempos para cá estou meio indiferente pela Seleção
Brasileira. Antes, como a esmagadora maioria dos brasileiros, deixava-me
influenciar pelas cores vibrantes do escrete, pela alegria contagiante que
ocorre em épocas de copas do mundo, associando-me aos carnavais fora de época
que costumam despontar nesses junhos quadrienais.
Especialmente na juventude, a gente se integrava nas carreatas
após as vitórias da Seleção. Observávamos as ruas coloridas, embandeiradas, a
emoção coletiva à flor da pele, os vivas aos nossos craques, as discussões
acaloradas sobre quem era melhor do que quem em cada posição nas equipes, o
ódio quase mortal pelos rivais argentinos, etc., etc. Eu imaginava: se já é
assim, quão retumbante seria se a Copa fosse realizada no Brasil!
E que decepção notar que tão arrebatadora expectativa se
materializou num muxoxo coletivo, numa impassividade tamanha como se em 2014 a
Copa esteja prestes a se iniciar no Círculo Polar Antártico..., sem a presença
da Seleção Brasileira!
Continuo torcendo pelo Brasil, festejarei se vier o Hexa.
Mas confesso que os argentinos já me são simpáticos. Então, se vier algum
resultado adverso para o verde-louro da nossa flâmula, confesso que o receberei
com a apatia dos renegados.
Este estado de ânimo, noto, no dia a dia, que é idêntico ao
de milhões de brasileiros, que ao se gabaritarem numa escala maior de
esclarecimento, do reconhecimento de que estão sendo manipulados, objetos de
massa de manobras políticas rasteiras e inconfessáveis, ficaram finalmente vacinados contra a hipocrisia e a
dissimulação.
Instintivamente estamos dando uma banana portentosa àqueles
que imaginaram que o circo mais galante do mundo dos esportes nos faria ainda
mais agradecidos e conformados pelo pão nosso de cada dia, acomodado nas bolsas
esmolas.
Pensaram, os insanos, que estádios faraônicos nos fariam
esquecer a falta de leitos nos hospitais, a violência galopante, a falta de
perspectivas no futuro, a Educação em frangalhos, a corrupção em dimensões
planetárias.
Em vez de mostrarmos coisas edificantes de nossa pátria,
mostramos ao estrangeiro nossas piores mazelas, nossa falta de planejamento,
obras inacabadas, infraestrutura caótica, uma demonstração melancólica de incompetência.
Que façam bom proveito do seu Titanic. Infelizmente, ainda
que vençamos, já perdemos!
Por Ana Lúcia Guizardi - publ. originalmente em maio/14