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23 de abr. de 2013

Debutei no "quinqua"; ou, saúdam com igual ênfase a primavera em flor e o outono de folhas ressequidas, não sei por quê!

Fiz cinquenta, amável leitor, graciosa leitora, agora em maio. Cinquentinha!

O que posso lhes dizer a respeito, se é que lhes interessa?

Que parece ontem eu exultava com um saco de brinquedos que o velho Chico Mendonça (pessoa generosíssima que está no Éden, juntamente com o seu xará mais mais famoso - o Xavier) mandou para nossa casa na Beira-Rio, Bom Jesus do Norte, no Natal, creio que de 1959 ou 1960?



Que ainda há pouco um orgulhoso pai saía sorridente da maternidade em Vitoria, encantado com o seu primeiro rebento nascido em 1979?

E de outra maternidade em Olinda/PE, igualmente radiante pelo nascimento do segundo filho, em 1981?

E de outra mais, no Rio de Janeiro, em 1982, com a única "filha mulher", encanto dos encantos?

E ainda outra, agorinha mesmo, em 1996, da mesma forma prenhe de alegria com a raspa do tacho de nome Gabriel?


Não. Prometo não filosofar quanto a rapidez do tempo, permitindo-me apenas adaptar uma citação de Léa Waider,  fidelíssima em traduzir o que vai em meu espirito ora cinquentenário: 

“Adoro caminhar em silêncio pelas sombras. Sou um bicho da noite, do crepúsculo. O barulho me fere a alma; busco a quietude, o contato comigo mesmo e com a natureza."

Espírito, aliás, que espero não desista desta carcaça antes que ela se torne secular (não deixemos as coisas inconclusas, amigo etéreo. Não se esqueça das células-tronco. Elas poderão nos dar um coração novinho, cheirando a tinta, imaculado de tantas emoções...; pulmões sem
nicotina; figueiredo sóbrio; e até, quem sabe..., deixa pra lá). 

Dito isto, obrigado a todos pelas dedicatórias evocativas de saúde, paz e longevidade (vou abusar dos parênteses: deduzo que os votos de parabéns quando se completa 50 não perdem em exaltação para os da mocinha que faz 15. 

Acho que há nisso uma contradição do inconsciente coletivo, que é saudar com igual fervor a Primavera varonil e o Outono de folhas ressequidas). 

Aos novíssimos amigos da confraria cinquental, eis que me apresento augurando a todos, e a mim também, a proteção da mesma potestade que dedica seus serviços aos cinquentões (em alguns casos, beirando ou até passando dos sessenta) Mick Jagger (que deu conta, com louvor, daquela fêmea estonteante, Luciana Gimenez), Gilberto Gil, Caetano, Zico, etc. e tal.

Eles estão aí a provar que nem tudo é bico de papagaio, reumatismo ou videogame com os netos.

Olhemos outros fatos positivos. Dia destes me surpreendi analisando com incomum interesse o caixa especial de 
um banco, mentalizando uma entrada triunfal daqui a 10 anos (passa tão depressa...) num banco qualquer, contemplando com desdém a jovialidade nas filas quilométricas.

- Pensam o que?, direi cá comigo, - tenho imunidade velhática, não entro em filas!

Da mesma forma, velhinho em folha lá pelos ¡dos de 2019, recebendo da Viúva, sem fazer lhufas, um salário-mínimo, dedicarei aos milhões de desempregados nas filas (moços, mas, ai, que gostosa desforra..., sem dinheiro!), nada mais que um olhar indiferente.


Sacanearei o hoje nonagenário Camilo Colla, viajando de graça nos seus ônibus... Ah!, quantas  oportunidades, quanta experiência enriquecedora me aguarda!

E o Estatuto do Idoso? Prevê até mesada para quando chegarmos à chamada terceira-idade (Jô Soares diz que só há duas idades: viva e morta)!

Ainda tenho bastante tempo (assim espero) para escarafunchar suas cláusulas, e dedicarei bastante atenção a esta da mesada. Já pensaram, eu, com quatro filhos, se cada qual me dispensar algum? Poderei dar a volta ao mundo na primeira classe do Queen Elisabeth!

Adoção, pasme! Existe cláusula de adoção no Estatuto!

Penso que deverá ser tal e qual se faz com as crianças, também vou estudar com muito interesse isso.

Será que a gente vai ficar num lugar tipo internato, à espera de um casal simpático, e de preferência rico?



Ficaremos em polvorosa, no pátio, roendo as unhas pela ansiedade de saber qual de nos será o felizardo?

- Aquele ali, branquinho, baixinho e barrigudinho, que gracinha!, diria a esposa maravilhada, ao marido apático, referindo-se a mim.

E eu antegozando a vida deslumbrante que terei dali em diante: férias na Disneylândia, passeio no shopping, aparelho auditivo com joysticks e 10 megas de memória... Hein, macanudo?

O único problema que terei de sanar é essa minha fixação pela dignidade, o anacronismo dos meus princípios segundo os quais só compensa a vida se vivida mediante os próprios esforços, através do trabalho ou do que dele resultar no pendurar das chuteiras.

Renunciar ao compromisso com tais princípios será preponderante, mas pensando bem isso não deve ser assim tão complicado...

Nosso presidente está aí mesmo a dar uma forcinha: compromisso é uma coisa que não se honra, necessariamente!


Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em maio/2004
Texto inspirado no "Velhinho em folha", de João Ubaldo Ribeiro, publicado em "O Globo" no dia 18/1/2004.