O tio era um homem que fazia da simplicidade e da humildade as mais fortes características, como podem comprovar os inúmeros amigos que conquistou em sua trajetória terrena, onde notabilizou-se por fazer o sorvete mais saboroso da região.
Talvez sua única vaidade era se gabar, há algum tempo, de que uma importante fábrica do Rio de Janeiro estaria disposta a contratá-lo a peso de ouro, ou na pior das hipóteses pagar muito bem por suas receitas: nem uma coisa nem outra, dizia ele, porque de Bom Jesus não saía nem por decreto, e a receita não podia vender, digo eu, porque era intraduzível em palavras o talento nato que dispensava tabelas burocráticas de pesos e medidas, o instinto e a boa mão.
Tio Cornélio levou consigo outra receita, a meu ver exagerada no ingrediente simplicidade sem nenhuma pitada de vaidade, desprezando os mais elementares padrões de conforto material a que um homem tem direito.
Ninguém podia interferir nisso porque partia de princípios próprios de sua personalidade minimalista e desarmônica com as mais modestas ambições terreais. Seus manos Oswaldo, Ismael, Antônio e Manoel, sobrinhos e demais parentes agradecem a todos os que levaram o derradeiro abraço ao devotado torcedor do Olympico F.C. e do Vasco da Gama F.R.
Descanse em paz, tio!
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em fevereiro/2003