Bons tempos, bons tempos. Rodava-se a manivela e do outro lado da linha fazia triiimmmm.
Já há quem se lembre com nostalgia da Telerj ..., da Telest. Como era bom... Alimentava-se o sonho de consumo de possuir um telefone, muitos sacrificando até o frango do fim de semana para poder juntar um caminhão de dinheiro durante longos anos e ... anham...!, passavam dias embevecidos a contemplar o reluzente aparelho analógico, de disco, mas que falava, ou melhor, falar mesmo, no duro, não falava, mas permitia que se conversasse à distância por seu intermédio.
Hoje os aparelhos são belíssimos, os mais modernos, o supra-sumo da tecnologia e do design, que cabem na palma da mão, e seus chips gradativamente menores, e em proporção inversa cada vez mais miraculosos fazem aposentar as velhas agendas, e pelo pique da remada mesmo, as nem tão obtusas secretárias eletrônicas encontrarão um fim triste e melancólico.
Aparelhinho tão popular e barato quanto um liquidificador (leio nos jornais que em algumas capitais já o distribuem gratuitamente, pagando-se apenas uma pequena taxa pela habilitação na operadora), mas o diabo é que não tem falado, ou melhor, não tem permitido que se converse através dele.
Aqui na terrinha observo pessoas portando garbosamente seus celulares ultramodernos com esponjas de aço (de 1001 utilidades) nas anteninhas, alguns com as faces vermelhas e as gargantas roucas de tanto gritarem na vã e desesperada tentativa de ouvirem e se fazerem entender.
Aqui na terrinha observo pessoas portando garbosamente seus celulares ultramodernos com esponjas de aço (de 1001 utilidades) nas anteninhas, alguns com as faces vermelhas e as gargantas roucas de tanto gritarem na vã e desesperada tentativa de ouvirem e se fazerem entender.
As reclamações são tantas que suplantam as relativas ao campeoníssimo Fernando Henrique.
Contas astronômicas constando ligações para localidades nunca antes imaginadas, linhas cruzadas, conversações bruscamente interrompidas, aparelhos que "engolem" os créditos no melhor estilo dos malandros orelhões comedores das fichas de antigamente, e o pior: ninguém se entendendo:
- O QUÊ, MULHER? F-A-L-A A-L-T-O. A galinha da vizinha? AHN? A gatinha na cozinha? Deixa pra lá. OLHA, COMPRA O PEIXE. É, P-E-I-X-E. AHNNN? PODE SER GAROUPA, NAMORADO, O QUE TIVER.
Alto risco o desse casamento, assim como negócios não realizados, pessoas passando fome por não conseguirem falar com a pizzaria, namoros desfeitos e mesmo requisição de serviços essenciais como hospitais, bombeiros e polícia inteiramente prejudicados pelo "mudão" ocorrido há poucos dias quando da mudança dos números de discagem.
Não atinamos para a sutileza do anúncio, que talvez quisesse nos incentivar a não ficarmos jogando conversa fora ao telefone, mas ao invés disso, inventarmos outra posição numérica para nossa melhor interação sexual, para variar um pouco dos conservadores dois números 6 (um deles, invertido).
Ou não era bem isso? Com certeza esse pessoal do 21, do 31 (171 lhes cairia melhor) não iria simplificar algo que podia complicar.
Mas como se diz que em tudo há um lado bom, resolvi tirar proveito desse caos.
Estou trabalhando nuns livrinhos de autoajuda que me renderão bons lucros e terão muita utilidade para os brasileiros.
Mas como se diz que em tudo há um lado bom, resolvi tirar proveito desse caos.
Estou trabalhando nuns livrinhos de autoajuda que me renderão bons lucros e terão muita utilidade para os brasileiros.
Ainda não decidi quais serão os títulos, mas estou pensando seriamente neste: " Como construir seu próprio telégrafo, passo a passo". Ou este: "Noções básicas de sinais de fumaça em dez lições".
O problema é que não consigo me comunicar com os índios para adquirir o know how.
Os celulares deles chamam, chamam ..., mas não respondem!
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em agosto/1999
Os celulares deles chamam, chamam ..., mas não respondem!
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em agosto/1999