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22 de fev. de 2013

À Índia irei..., de navio; ou, acidente da Air France deixam nossos corações despedaçados

..Toda a vida que se vai, especialmente desta forma, torna menos interessante e mais triste a que fica...

Eu era gerente administrativo e financeiro da Cia. Internacional de Seguros, Sucursal Recife, nos idos de 1981/1982.

Principalmente porque naquela época o supra-sumo da tecnologia de comunicação nas empresas, além do telefone, era o telex (hoje confinado nos museus), tinha de viajar constantemente de avião para o Rio de Janeiro, onde era sediada a matriz da empresa, na Rua Ibituruna 81, Tijuca.



Além dessas viagens longas, fazia outras mais curtas, também de avião, a Salvador, Natal, Aracaju e Terezina (João Pessoa e Maceió, cidades de curta distância a partir de Recife, ia de automóvel) a serviço.


Voava pelas asas das extintas Vasp, Varig e Transbrasil.

Sempre tive medo de avião. Mas essa máquina me exercia fascínio maior que o medo, daí porque em vez de evitar as viagens, ficava eufórico toda vez que tinha de encarar um jato 737 ou um 747 (uma única vez viajei no famoso turbo-hélice Electra, na ponte aérea Rio x SP), até forçando um pouco a barra quando minha presença nos lugares não se mostrava tão imperativa. 

A secretária já sabia de minha preferência por voos paradores, e marcava meus bilhetes sempre que possível nesses “cata-jecas” porque fiquei viciado das doses de adrenalina quando os bichos desciam e subiam. 


Em vez de uma viagem direta, preferia os que paravam em Terezina, Ilhéus, Itabuna, lamentando que também não descessem em Belo Horizonte ou Vitória antes de chegarem  ao Rio.


Pois é. Dizem que quanto mais se envelhece, mais temor se adquire. Hoje tenho esperanças, embora remotas, de que antes de morrer ainda hei de conhecer a Índia. 

Trata-se de um país exótico e de fortes contrastes econômicos e socioculturais que me deslumbram, não sei bem explicar a razão, sentimento desencadeado em minha adolescência, presumo, pelo cantor Nilton César (lembram? À Índia fui em férias passear/ tornar realidade um sonho meu/ jamais eu poderia imaginar...). 

Mas viajaria de navio, jamais de avião, porque o medo agora é maior, reduziu a frangalhos aquele corajoso espírito aventureiro.

Como diz Reinaldo Azevedo com mórbida ironia, avião é seguro, nenhum jamais deixou de voltar à Terra. 

Ou ao mar, digo eu de forma redundante, pois que não olvido que Reinaldo se refere ao nosso Planeta como um todo. 

E o faço pensando no verdadeiro motivo que me motivou estas mal traçadas, a partir daquela segunda-feira 1/6 aziaga, quando não pude controlar as lágrimas diante da TV pensando nas 228 almas que se foram de maneira tão trágica, tão abrupta, tão sem nenhuma chance (acidente com um avião da Air France, que ia do Rio de Janeiro para Paris e caiu no mar). 

Meu filho Gabriel perguntou o óbvio: - está chorando, pai? - Sim, filho, respondi. 


E acrescentei mentalmente que o fazia por tantos sonhos desfeitos, tantas esperanças rudemente interrompidas, tantos corações que ficaram pulsando em pedaços, tanto prejuízo para a espécie humana como um todo. 

Acidentes acontecem, não é impossível que neste momento em que escrevo caia uma aeronave no topo de meu crânio em estágio avançado de calvície cocurutal. 

E pensando que todo acidente deve ter suas causas irrefutavelmente reveladas, não me conformo que caixas-pretas submerjam facilmente com tanta tecnologia disponível. 

Se as caixas alaranjadas, chamadas de pretas talvez para evocar luto (na realidade para ficarem mais visíveis), são fundamentais para desvendarem as causas de acidentes, além de serem praticamente indestrutíveis como são, deviam também ter a capacidade de boiar, não parece razoável?


Temo que jamais saibamos a conjunção dos fatores tenebrosos que causou esta tragédia, temor que se transforma em pânico ao pensar que o vilão no anonimato pode desencadear outras desgraças assemelhadas. 

Pelo sim, pelo não, deixarei que meu instinto fale mais alto que a razão; avião é o meio de transporte mais seguro, mas não irei à Índia, nem a qualquer lugar, voando de forma espontânea, como fazia alegremente naquelas aeronaves jurássicas quase 30 anos atrás. 


Que Deus acolha os que se foram e tenha misericórdia pelos que ficaram na dor da saudade. 


Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em junho/2009