Pior: o povo parece estar conformado com tudo o que vem
acontecendo, não faz um movimento sequer de protesto, de exigência em prol de sua cidadania.
Está igual tronco de enchente, na marola de uma Justiça lenta, de interpretação complicada, sujeita a firulas mis de acordo com a sagacidade dos advogados, que esticam a paciência até o limite de ruptura.
Faço aqui a minha parte. Só que a veia poética de má qualidade precisa se valer da preciosa inspiração de Patativa do Assaré - e também Dodô e Osmar/vi Dirceu atrás da grade/abre Marília, sou eu/sonhando num céu de fogo/libertas quae sera tamem/e um cheiro de tangerina/descascava Jorge de Lima/as invenções de Orfeu/rezava Murilo Mendes...
Não, não, stop. Só o Patativa! É que me deixei levar pela linda canção de Zé Ramalho, "Xote dos Poetas", que meu cérebro vinha cantando no ritmo destas teclas indignadas.
Ah, e "Libertas quae sera tamem", ou "Liberdade, ainda
que tardia", tem tudo a ver com Bom Jesus carregando seu pesado fardo.
Não, não, stop. Só o Patativa! É que me deixei levar pela linda canção de Zé Ramalho, "Xote dos Poetas", que meu cérebro vinha cantando no ritmo destas teclas indignadas.
Ah, e "Libertas quae sera tamem", ou "Liberdade, ainda
que tardia", tem tudo a ver com Bom Jesus carregando seu pesado fardo.
Prefeitura sem prefeito
Patativa do Assaré
Nessa vida atroz e dura/
Tudo pode acontecer/
Muito breve há de se ver/
Prefeito sem prefeitura;/
Vejo que alguém me censura/
E não fica satisfeito/
Porém, eu ando sem jeito,/
Sem esperança e sem fé,/
Por ver no meu Assaré/
Prefeitura sem prefeito./
Por não ter literatura,/
Nunca pude discernir/
Se poderá existir/
Prefeito sem prefeitura./
Porém, mesmo sem leitura,/
Sem nenhum curso ter feito,/
Eu conheço do direito/
E sem lição de ninguém/
Descobri onde é que tem/
Prefeitura sem prefeito./
Ainda que alguém me diga/
Que viu um mudo falando/
Um elefante dançando/
No lombo de uma formiga,/
Não me causará intriga,/
Escutarei com respeito,/
Não mentiu este sujeito./
Muito mais barbaridade/
É haver numa cidade/
Prefeitura sem prefeito./
Não vou teimar com quem diz/
Que viu ferro dar azeite,/
Um avestruz dando leite/
E pedra criar raiz,/
Ema apanhar de perdiz/
Um rio fora do leito,/
Um aleijão sem defeito/
E um morto declarar guerra,/
Porque vejo em minha terra/
Prefeitura sem prefeito./
E agora vou eu, no embalo do genial Patativa:
Como é triste a minha sina,/
De votar e não ter eleito,/
É porque não tenho peito,/
de mudar essa doutrina./
Quero dizer, consciência,/
De lutar pela cidade,/
Exigindo idoneidade,/
Sobretudo sapiência./
De quem?, perguntas então:/
De todos, respondo no ato,/
Quem quer mudar este fato,/
Tem que ter disposição./
Cidadãos de mui matizes./
Juízes, políticos, o escambau,/
Têm que deter o vendaval,/
Pra salvar nossas raízes./
E dizerem, igual ao poeta,/
Em desabafo valente,/
Dignificando nossa gente,/
Cujo progresso é a meta:/
"Nem mais um passo, covardes,/
Nem mais um passo, ladrões,/
Se os outros roubam as bolsas,/
Vós roubais os corações!"/
Falando assim aos fados adversos,/
Eles ficarão no seu lugar,/
Deixando de nos paralisar,/
Na busca do nosso sucesso./
E aqui paro esperançado/
De resolvermos os problemas,/
Um prefeito e adeus dilemas,/
Bom Jesus não mais travado!/
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em novembro/2008