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1 de mai. de 2013

Como João Ubaldo no Leblon, bate-papo num boteco de Bom Jesus


- Ô, Zêinrique, não vai comentar a "limpa" que a Polícia Federal fez em Bom Jesus?, indagou o Palhares, um amigo de data recente, já que muitos dos antigos foram estudar a geologia dos campos-santos... (e estão por aí com você, Machado).

- Não, não vou, respondi um tanto ríspido.

Meio boquiaberto, Palhares retrucou:


- Vai perder a oportunidade de dar uma espinafrada nessa cambada?

- Vou.

- Pô, cara. Tô  estranhando... Vai ver está também com o rabo-preso..., disse com um risinho sarcástico.

- Rabo-preso coisa nenhuma. É que estou com uma preguiça...

- Preguiça? 



- Sim. Nada mais espanta. Jogar criança pela janela; comprar deputado em parcelas mensais; um, dois, três, quatro, cinco, e quem sabe mais prefeitos diferentes em Bom Jesus do Itabapoana numa mesma gestão; cinegrafistas da Globo, no helicóphero, mostrando para todo o Brasil nossa cidade como uma Chicago dos anos 1930 em miniatura... Tudo tão letárgico que escrever está se tornando inócuo.


- Inócuo?

- É. Nem os ganhadores do Pulitzer conseguiriam fazer um texto que redespertasse a capacidade de indignação das pessoas, amortecida pelo modus vivendi contemporâneo, onde a única coisa que vale para muita gente é o TER, não importa como, mesmo que tenha de matar figurada ou literalmente o SER.

- Como assim?

- Já está cansativa, embora a cada dia mais legítima a máxima de que a conquista das coisas através do trabalho, da honestidade, da ética e da honra, está fora de moda há  tempos... Como dizíamos no passado, isso hoje é cafonice, está démodé, é boco-moco.

- Verdade das boas.

- Existem três tipos de gente, Palhares: a que tem ou não tem, em que ambas as circunstâncias advêm da dignidade e da honradez; a que não tem, mas gosta de ostentar o carrão da financeira ou a casa da Caixa; e a gente pior: a que tem, às vezes muito mais do que precisa, mas em decorrência de roubo, furto, estelionato, desvio, corrupção, etc, etc, etc, que a malignidade é infinita.

- Realmente, Zêinrique.

- Esta última categoria mata indiretamente doentes nos hospitais sem leito, Palhares, porque o dinheiro que poderia financiar o sistema de saúde pública está em grande parte nos bolsos dela; 


Essa gente que recebe benefícios indevidos do INSS é a parasita que vive, muitas vezes nababescamente, às custas alheias, inviabilizando a que estas alheias desfrutem, merecidamente, a recompensa por 40 anos de trabalhode sol a sol porque a Previdência, quebrada, é incapaz de suster condignamente o fiapo de vida que lhe resta.

Essa gente...

- Você não disse que não ia comentar?, interrompe bruscamente o Palhares, com um sorriso maroto, quando eu já estava quase apoplético. E completou:

- Rá, rá, rá. Ta na veia, Zêinrique, não pode controlar...

- Ops. Foi mal. Não falo mais nada, redargui, amuado.

- Só mais uma coisinha, insistiu ele. - Em qual categoria você se coloca?

- Pertenço com muito orgulho à categoria da maioria dos bom-jesuenses, dos brasileiros: não ostentamos nada, e quase nada temos. Mas somos felizes. 
E dormimos tranquilos, sempre em paz com a nossa consciência.

Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em julho/2008