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1 de mai. de 2013

Fe$ta de Ago$to: cobrança de ingressos é injustiça

Quando garoto, fato que mais me deprimia era a falta de dinheiro para ir ao Cine Monte Líbano vibrar com os djangos e os ringos, ou ao campo do Ordem e Progresso nas tardes inesquecíveis de futebol. 

Membro de família pobre (muito), temperamento introvertido (sempre), nunca tinha a coragem de pular muros ou dar um jeito de burlar os bilheteiros, ações que meus amigos tiravam de letra, na maior naturalidade. 


Que ódio eu sentia de mim mesmo quando após horas de preparação psicológica, de ponderações mil, via aquelas duas mãos em concha (escadinha) e a algazarra de vozes juvenis incentivadoras mas, ao colocar o pé no "cadafalso", coração acelerado, suando em bicas, desistia melancolicamente na hora de atingir o nirvana, para a raiva e os xingamentos dos outros moleques.

Bom era quando meu pai Oswaldo Vaillant me dava uns trocados ganhos no ofício suplementar, porém lamentavelmente eventual de garçom do Aero Clube; curtia numa boa a arte de Chiquinho Maravilha, Baduca, Haroldinho e outros craques, assim como a saga do então jovem Clint Eastwood com sua pistola de seis balas que disparava 60 de uma só vez, pagando meus próprios ingressos com a dignidade de um lorde.

Lembro disso e imagino mais sensibilizado a decepção de muitas pessoas, muitos jovens, que não puderam assistir aos melhores shows da última Festa de Agosto por falta de grana para a entrada. 


Diabos, uma gente que já não tem quase nenhuma opção de divertimento ter de descolar R$ 20 na bilheteria, fora R$ 2,50 por uma lata de refrigerante, R$ 3 para deixar o filho se empoleirar por dois minutos num brinquedo, e outros tantos para a cervejinha e o tira-gosto. 


Por baixo, R$ 100 para um casal e dois filhos, numa única noite, apertando o cinto, economizando, foram poucos, muito poucos! E esses R$ 100 significam para vários cidadãos cerca de 10 dias de trabalho, vejam só.

Recordo um caso que acho até que é piada, de dois amigos (mui amigos!) e suas respectivas amantes que se encontraram no estacionamento de um motel. Cúmulo da coincidência: cada qual estava com a mulher do outro. 

Passado o constrangimento inicial, um deles diz: - o correto é irmos embora, todos. Mas o outro retrucou: 

- É ruim, hein. Vocês já estão saindo, e nós, chegando!

Moral da história: nem tudo o que parece correto é justo.

A promotora do evento e proprietária do Parque de Exposição não age incorretamente ao cobrar ingressos. 

Ela não é uma instituição de caridade e precisa apresentar resultados financeiros positivos aos seus cooperados. Se a empresa investe, tem de ter o retorno desse investimento, é elementar. 

Todavia, não acho justo que se tire proveito de uma instituição pública centenária, como é a tradicional Festa de Agosto, para auferir lucros num negócio inteiramente diverso das suas atividades tradicionais, desculpem os que têm erisipela ou eriçam pêlos ao encarar o contraditório. 

Usar este ícone, este emblema com seu forte apelo tonificado pela comunidade bom-jesuense em 143 longos anos me parece usurpação. 

É quase semelhante a um pintor de paredes que porventura usar a escada da prefeitura (de todos os cidadãos) para executar trabalho para si. 

Ora, dirão alguns, exibindo laivos de justiça social: - houve atrações também para quem não pôde pagar.

Sim, houve, mas não minora o sentimento de discriminação. 

Embora meus 52 anos se incompatibilizem com o modelo de letras e de ritmos dessas duplas de bons-mocinhos e grupelhos que se destacam apenas pelos trajes sumários, é, como diz o bordão, "disso que o povo gosta", tenha ou não dinheiro para pagar o ingresso. 

Neste caso específico em que, repito, o apelo era a festa popular com todo o seu simbolismo e sentido cívico, as atrações deviam contemplar a todos por igual. 

Tragam lá o Roberto Carlos, a Britney Spears em março, novembro ou qualquer outro fora agosto e cobrem R$ 1 mil, R$ 2 mil, R$ 5 mil pela entrada. 

Vai quem quiser e quem puder, nada contra. Aliás, até aplaudo, precisamos de atividades e eventos culturais mesmo. 

Mas não privem o povo daquilo que é seu, no mês mais sensível à sua religiosidade e convicções cívicas: é autoritarismo disfarçado e segregação revelada.

Vejo tantos políticos (principalmente nesta época de piracema), tantos empresários, tanta gente influente aproveitando-se de alguma forma da festa. 

Será que as calcinhas da cor do luto (desconfio que o preto é proposital, em respeito à morte da verdadeira arte) do showbiz são assim tão dispendiosas que não possa essa gente abonada enfiar as mãos nos bolsos recheados para uma "vaquinha", proporcionando os shows para todos? 

Que fim levaram as parcerias e os patrocínios?

Um cínico eh, eh, eh pelo equívoco monumental de quem achar que esta minha cara vermelha tem a cor de minha convicção político/ideológica, que Chico Buarque, de sua mansão parisiense a cantar loas a Fidel torceria o nariz se a conhecesse. 

Mas na "festa do povo", se não puder calcinhas pretas para todos, sem distinção, que venham outras vestes mais modestas trazer alegria geral.

O Divino Espírito Santo agradecerá esse lustro de igualdade e sensibilidade em seu cetro.
PS - A palavra inovação deveria ser a meta, a essência, o norte. 

Que tal acabar com esta simbiose de festa com exposição agropecuária, pondo fim à fusão da iniciativa pública com a privada? 

Está claro que esse modelo está desgastado, exaurido. A CAVIL promoveria sua Exposição fora de agosto, cobrando ingressos (ou não), nada mais natural e justo. 

A prefeitura faria a Festa de Agosto sem ônus para o povo. 

Simples. Mas please, por obséquio, levando os shows para longe do centro da cidade. 

Como? Onde? Ah, já estão querendo demais!

Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em agosto/2006