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11 de mai. de 2013

Bonjesino chorou incontrolavelmente pela cassação da prefeita de Bom Jesus/RJ

Buááááá, Buááááááá, chuif, chuiiiffff, if, if...

Que susto! Passava ontem em frente ao muquifo de Bonjesino, esforçando-me na discrição para não ter de me encontrar com o brutamontes, quando ouço a trovoada..., digo, a choradeira de volume tão elevado, tão entrecortada de soluços de tenor, que lembrei-me de uma das figuras de linguagem do genial Nelson Rodrigues: "de trincar catedrais"!



O amável leitor e a graciosa leitora já conhecem Bonjesino, um mulato de tamanho descomunal, muito simpático, humilde, bondoso.

No entanto, o que se destaca mais na personalidade dele é ser ingênuo, extremamente crédulo, e mais ainda, a paixão que nutre por Bom Jesus e seus políticos.

Como dizia, eu passava em frente à casa dele, mas tinha compromissos outros e não podia jogar conversa fora, razão pela qual me esgueirava para que ele não me notasse.

Porque, como sempre, teria de conversar interminavelmente com o velho amigo, depois de quase me matar por constrição, já que tentativa de assassinato, para ele, tem o nome de abraço!

Mas, claro, não podia deixar de ver o que estava ocorrendo.

Aproximei-me com passos apressados, transpus o umbral da única porta do barraco de dois cômodos e o vi sentado num banco feito de tronco de árvore, os dois braços cruzados sobre o peito, a cabeça encurvada neles.

- O que acon...

Não deu tempo de completar a pergunta. O gigante deu um salto em minha direção, felizmente esquecendo do "abraço" porque a ansiedade de falar era tão grande que o fez negligenciar involuntariamente as boas maneiras.

- Chefiaaaaa, buááááá..., humpft..., snifff...

- Calma, Bonjesino, que bicho o mordeu?

- Ah, chefia..., que desgraça!, falava e fungava de tal forma que pensei que ele fosse ter um colapso.

- Cassaram a prefeita, chefiaaaaa... Cassaram ela, tadinha..., snifff, chuifff.

- Vamos combinar uma coisa, Bonjesino: pare de chorar senão vou-me embora, ameacei, agora mais calmo após conhecer a natureza do problema.

- Ah, chefia. Ela não merecia...

- Que vergonha, chorar por causa de política... E afinal, Bonjesino, este choro está denotando uma contradição...

- Êpa, que contradição?, retrucou, as sobrancelhas já iniciando os primeiros traços de acento circunflexo invertido.

- Você não ama de paixão todos os políticos? Então? Assume outro no lugar dela e fica tudo bem...

- Perfeitamente, chefia. Entendi a malícia. Mas afirmo que todos os colocados, do primeiro ao último, estão perfeitamente aptos a nos governar. Todos, está entendendo, todos só aceitaram disputar a eleição depois que fizeram uma autoanálise, uma varredura minuciosa em seus íntimos e concluírem que cada qual tinha a capacidade de fazer o melhor pela cidade.

- Nenhum interesse pessoal? Sabe como é..., o salário é bom..., tem as mordomias..., tem a...


- Alto lá, seu jornalistazinho de meia-tijela. Alto lá. Que Deus não dê ouvidos às suas palavras maledientes.

- Então, Bonjesino. Não seria a lesma lerda?

- Lesma lerda?

- Ahnn..., digamos..., todos eles não nos mandam ir tomate cru depois de eleitos?

- Tomate cru?
- Bonjesino, a ponte que caiu, você entende?

- Caiu onde?

- Baralho...

- Não gosto.

- O quê?

- Não gosto de jogar baralho. E para de mistério, chefia.

- Repito, Bonjesino. Se todos são bons, nada vai mudar, ô rapaz. O município vai continuar com esse intrépido desenvolvimento, mais um pouco e estaremos batendo a Noruega em nível de qualidade de vida...

O colosso levantou os olhos para cima à procura do Senhor, tornou a fitá-los nos meus, e com uma brandura desconcertante, em tom professoral, disse:

- Chefia. Sua sorte é que até os condenados à morte contam com indultos dos governos. Nosso Senhor vai lhe perdoar tanta ironia...

- Responda, Bonjesino. Por que o choro, se outro monge carmelita irá nos conduzir pelos prados verdejantes do paraíso?

- É que...

Seu rosto contorceu-se tal como fazem as crianças naquela careta que antecede o choro. Mas interrompi o novo vendaval que prenunciava.

- Vamos combinar...

- Tá bom. Não vou chorar mais -, prometeu o gigante, passando o polegar e o indicador da mão direita nos olhos, e as costas da mão nas narinas para eliminar o fio translúcido de meleca que descia, sorrateira, até os lábios.

Pigarreou e continuou:

- Na realidade, chefia, não sei de quem tenho mais pena: se da prefeita, injustamente cassada, ou de quem vai entrar.

- Explique melhor.

- Quem entrar vai ter tanto problema até pegar o ritmo das coisas... Vai trabalhar tanto, coitado... Já ela...

- Tinha pegado o ritmo das coisas..., interrompi.

- Claro! Foram 4 anos, chefia. Quatro anos de sacrifícios! A mulher era um azougue! Pegava daqui, dali...

Percebendo meu sorriso enviesado, Bonjesino perdeu as estribeiras. Virou-me as costas e disse secamente, só faltando me expulsar apontando a porta:

- Boa-noite, chefia.

- Boa-noite, Bonjesino. Nada de chorar mais, hein? Já pensou se acontece como no período 2005 a 2008, em que tivemos nada menos que 5 prefeitos? De onde você vai tirar tantas lágrimas?


Autor: José Henrique Vaillant