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4 de mar. de 2013

O Perfume; ou, banheiros da rodoviária de Bom Jesus: fedor insuportável

Estou lendo um livro muito bom que versa sobre cheiros, odores diversos, senso olfativo incrivelmente desenvolvido. Digo que a história é boa pela originalidade, embora catinguda e violenta. 


Trata-se de "O Perfume", de Patrick Suskind. E lá vai um trechinho, para quem tiver estômago:


"Aqui, no sítio mais fedorento de todo o reino, nasceu Jean  Baptiste Grenouille, a 17 de Julho de 1738. Foi um dos dias mais quentes do ano. O calor pesava como chumbo sobre o cemitério, projetando nas ruelas vizinhas o seu bafo pestilento, onde se misturava o cheiro a melões apodrecidos e a trigo queimado. 

Quando começou com as dores de parto, a mãe de Grenouille encontrava-se de pé, atrás de uma banca, na Rua Aux Fers, a escamar as carpas que acabava de estripar. 


Os peixes, supostamente pescados no Sena nessa mesma manhã, já cheiravam pior do que um cadáver. A mãe de Grenouille não distinguia, no entanto, entre o cheiro a peixe e o de um cadáver, na medida em que o seu olfato era extraordinariamente insensível aos cheiros e, além disso, a dor que lhe apunhalava o ventre eliminava toda a sensibilidade às sensações exteriores. 


Apenas desejava que a dor parasse; desejava pôr termo o mais rapidamente possível a este repugnante parto. Era o seu quinto. Todos os outros se haviam verificado atrás desta banca de peixe e sempre se tratara de natimortos, ou quase, porque a carne sanguinolenta que dela se escapava não se diferençava grandemente das miudezas de peixe que juncavam o solo, e também não possuía, além disso, muito tempo de vida.


à noite, tudo era varrido a trouxe-mouxe e levado nas carroças, em direção ao cemitério ou ao rio. Era o que deveria passar-se, uma vez mais, naquele dia e a mãe de Grenouille, que ainda era jovem, vinte e cinco anos feitos, que ainda era bonita, que conservava quase todos os dentes e tinha ainda cabelos e que, independentemente da gota, da sífilis, e de uma leve tuberculose não sofria de qualquer doença grave, que esperava viver ainda muito tempo, talvez cinco ou dez anos, e talvez até mesmo casar um dia e ter verdadeiros filhos na qualidade de respeitável esposa de um artesão viúvo (por exemplo)...


A mãe de Grenouille desejava que tudo já tivesse acabado. E quando as dores de parto se fixaram, agachou-se, deu à luz debaixo da sua banca de peixe, tal como das vezes anteriores, e cortou com a faca de peixe o cordão umbilical do recém-nascido".



Lembrei-me do banheiro da rodoviária de Bom Jesus do Norte (o da outra Bom Jesus chegava a ser pior, não sei hoje), e também de já ter estrilado aqui mesmo nas páginas da Status sobre a fedentina, o furdunço que de lá emana para léguas distantes. 


Interessante é que dois, três anos atrás, o toilette foi reformado, colocaram novos revestimentos nas paredes e no piso, mictório inoxidável, uma beleza. Pensei: agora vão manter limpinho e cheiroso.

Ledo engano! O vaso sanitário e a cuba inox estão impregnados daquela velha e sórdida resina esverdeada metida a besta, que quer porque quer se comparar às pedras sanitárias, mas com efeito contrário. 


As pedras vão perdendo o viço à medida que são usadas; mas a resina, quanto mais se usam o mictório e a privada, mais se encorpa, ganha robustez e odor abomináveis. 


Bem verdade que ela não é tão valente a ponto de encarar uma esponja de aço de 1001 utilidades, mas em verdade vos digo que ela está livre da esponja por séculos e séculos, amém.


Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em março/2009