Sociólogo Herbert José de Souza 13/11/1935 - 9/8/1997 |
E interessante a natureza humana: jamais, em tempo algum, o ser humano conformou-se de imediato com a perda, mesmo sabendo ser ela inexorável e parte integrante do processo evolutivo.
E tais perdas fazem-se sentir mais acentuadamente quando se trata de um ente querido, e Betinho o era para a maioria dos brasileiros por ter sido o expoente e o guardião maior da nossa conspurcada cidadania.
É certo, todavia, que alguns não lamentam sua ausência, talvez até sentindo um certo júbilo pelo seu passamento.
São os que sabotam a dignidade, a moral e a ética; os sofistas na interpretação das leis que absolvem ou condenam crimes, às vezes hediondos, considerando pura e simplesmente o tamanho da conta bancária de quem os cometeu;
Os que trabalham nove meses em toda a vida, e por firulas dicotômicas da lei, reivindicam e conseguem aposentadorias vitalícias, milionárias, que aviltam e desonram o trabalho honesto;
São os representantes legislativos, que das terças às quintas batem o ponto mas nada fazem, senão quando convocados extraordinariamente a peso de ouro, além daqueles que transformaram as esperanças em si depositadas através do voto, em uma dinâmica e finória imobiliária politica, com compra, venda e aluguel de deputados e mandatos;
São, enfim, os lacaios da imoralidade, os velhacos da indignidade, os patifes da torpeza que farejam, aqui e acolá, uma possibilidade de também chafurdar neste imenso lamaçal.
Betinho partiu, e com ele parcela considerável da esperança de construirmos uma pátria mais justa. Os órfãos, estão mais órfãos; os destituídos, mais carentes; os marginalizados, mais à margem.
Não que ele fosse, por si só, a tábua de salvação, mas porque emanava, daquela figura frágil, a essência irresistível da indignação pelas injustiças, com um poder arrasador de “contaminação”.
Era um lenitivo para seu povo, o porta-voz pragmático e sincrético dos menos bafejados pela sorte, possuía uma aura de dignidade que tinha o poder avassalador de implodir a prepotência e a veleidade dos que têm a obrigação de zelar pelo Brasil.
O CIDADÃO Betinho nos deixou, mas não saiu da vida para entrar na história porque já era a própria história em vida.
Foi ele um proscrito na época da ditadura dos generais, mas porque nunca se acovardou, jamais demonstrou tibieza em pugnar pelas suas convicções alicerçadas no tripé liberdade, igualdade e fraternidade.
A volta do irmão do Henfil, tão sonhada e decantada em prosa e verso, trouxe-nos imensa felicidade.
Agora, porém, que soou o momento da última despedida, sentimo-nos tomados ainda mais pela emoção e a dor da saudade.
Mas havemos de superá-las auxiliados pela evocação de uma velha máxima: “um homem livre nunca morre”.
Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em setembro/1997