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28 de fev. de 2013

Entrei pela saída


A velha distração que a cada dia me prega novas peças, desta vez foi determinante para eu decidir que daria (mais) uma crônica. 

Já disse neste espaço a você, amável leitor, graciosa leitora, sobre acender cigarro pelo filtro (meu recorde foi três, no mesmo dia); 


Discar várias vezes para o número errado, escrevendo num papel a advertência de “não esquecer o número” e depois me perguntar “que número?”; 


Ver-me na perigosa situação de tentar furtar um carro, esforçando-me para abri-lo certo de que era o meu próprio (detalhe: diferente na marca e até na cor); 


Enfiar a chave em motos de outros (neste caso só nas vermelhas, pensam que estou tão maluco?); estacionar e, ao voltar, decidir ir à delegacia dar queixa do sumiço do veículo, descobrindo tempos depois que o deixei noutro local; 


Trancar a porta e após ter percorrido longos trechos, dar meia-volta ao jurar que a deixei aberta, aproveitando para ver se o computador devidamente desligado foi..., desligado; se o fogão não vai consumir todo o gás porque com essa minha desatenção posso ter deixado um bico aberto, com ou sem chamas. E por aí vai.


Agora aconteceu em Vitória, onde fui estar com minha querida filha Mônica no dia 17/5, ficando por lá dois dias. 

Um adendo: o que vai a seguir ocorreu em cerca de dois minutos, se tanto, mas daria um belo roteiro de comédia pastelão.
Foi o caso de ao deixar minha filha no seu trabalho na Reta da Penha, ter resolvido tomar um ônibus para o shopping. 

Era um micro-ônibus, daqueles verdinhos que abundam a belíssima capital do Estado capixaba. 

O danado do celular que toca justo no momento em que o coletivo parou foi o componente fundamental para a mancada. 


Meu irmão Gustavo chamava de Taubaté/SP, assunto importante a esgotar de vez minha pouca concentração.

Ônibus parado, conversa acalorada, subi no cadafalso, digo, nos degraus fatídicos porque eram os da porta traseira. 

Acomodei-me numa cadeira da última fila continuando a conversa. 


Em meio ao bla, bla, bla notei que todas as atenções se voltaram para mim. 

Mais um pouco e eu estava sendo observado com a mesma atenção e encanto com que um entomologista contempla uma rara borboleta. 

- Gozado como tantos pares de olhos estão justo na minha direção, pensei. - Estranho porque são pares de homens e mulheres, pensei ainda mais intrigado. - Se fossem somente os do antigamente denominado belo-sexo... 


Não, não, tornei à realidade. Os janeiros chegaram e esse privilégio de outrora foi pro brejo há tempos. 

E patati, patata, o aparelho já com superaquecimento na minha orelha (deviam inventar um arrefecedor de temperatura para celulares), e os pares de olhos transformados em inúmeros pontos de interrogação, exceto os de duas crianças que riam um riso irônico, como se vissem no meu ombro cocô de passarinho.


Resolvi desatarraxar um sorriso forçado, meio amarelo, e até dei um leve aceno para as crianças. 


Notei que o ônibus continuava parado. Olhei para as portas, ninguém subindo ou descendo, tráfego calmo àquela hora. 

E papo vai, papo vem, outro par de olhos autoritários que me fulminava pelo espelho retrovisor interno me gelou:

- A entrada é pela frente, senhor -, recebi a sentença cruel, assustadora, assim, de chofre. 


Desatarraxei ainda mais o sorriso, nesta altura marron (ou já teria se transformado em verde, contrastado pelas faces em tons que lembrariam um pimentão maduro?). 


- Oh, mil desculpas, tentei remediar o mal-estar, fazendo mesuras as mais diversas, justificativas esfarrapadas tão falsas como uma cédula de 3 Reais. 

- Onde tenho andado com a cabeça?, saiu a frase estereotipada que 11 entre 10 pessoas pronunciam neste tipo de situação. 


É que os ônibus (pelo menos os daquele tipo) não têm o bom e velho cobrador de antigamente. Paga-se na entrada ao motorista, como não lembrar? 


- Gustavo -, abri um parênteses no assunto. - Sabe o que está acontecendo? -, falei alto, para que todos os passageiros ouvissem bem. 


- Entrei no ônibus pela porta de trás -. E ainda mais alto: - estão pensando que tentei dar um golpe de 2 Reais. 

Aí deu-se a catarse, todos soltaram sonoras gargalhadas, inclusive o motorista. 


Só não gostei de um par de olhos masculino, cujo dono sentava numa cadeira mais ao meio. 

Seria capaz de ler naquele semblante sarcástico: - pensa que engana a todos? A mim não. Conheço seu tipo. Dou 10 por 1 que não há ninguém conversando ao telefone com você. Tudo encenação -.

Pois é. Planar com os pássaros, no mundo da Lua, dá nisso. Qualquer dia bato de frente com um avião!


Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em maio/2010