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13 de abr. de 2013

Pit Bull morde: poder público, assopra

É difícil tocar de modo imparcial num tema tão comovente como o da menina de cinco anos que foi atacada gravemente por um cão Pit Bull na calçada de sua casa, em Bom Jesus do Itabapoana.

Só quem não é pai nem mãe, como boa parte dos proprietários desses animais pode, embora não devesse, deixar de aferir na plenitude o que significa a dor de sentir as dores físicas e psicológicas de um filho, principalmente na idade da inocência, sem nenhuma possibilidade de se defender contra um gigante de tamanhas força, ferocidade e proporção.



Lembrei-me do poeta, que no auge do desespero pelo drama de uma filha pequena consumida por enfermidade, escreveu: 

“ Ó precioso ser/ ó filha minha. Se os céus me ouvissem a paterna prece/ e a mim o teu sofrer passar, pudesse/gozo me fora a dor que te espezinha!”

O brasileiro adora cachorros. Segundo pesquisas, existe hoje no país um animal para cada cinco habitantes (o dobro recomendado pela Organização Mundial de Saúde). 

Mas isso não seria um problema se, hoje em dia, não tivesse mudado o perfil dos donos de cachorros. 

Antigamente procuravam-se cães para companhia, para guarda ou até mesmo para exibição. 

Hoje aumentou a proporção da procura de cães considerados de instinto bravio, como Rottweiler, Pit Bull, Dobermann, Fila Brasileiro, Mastim Napolitano, Bull Terrier, entre outros.

E o lamentável é que boa parcela dos que procuram essas raças o fazem por puro exibicionismo, para demonstrarem força e poder, para aduzirem das feras a aura da valentia que não possuem, o antídoto para a própria insegurança de caráter. 

O resultado? Mais de 1.000 ataques de cães registrados diariamente no Brasil, segundo as mesmas pesquisas.

O Pit Bull é considerado por muitos o melhor cão de combate, capaz de vencer oponentes duas ou até três vezes maiores. 

Sobressai-se pela coragem, agressividade, vigor, robustez, agilidade, incansável persistência, habilidade para lutar e morder, grande resistência física, tolerância à dor e enorme capacidade de recuperação dos ferimentos. 

Por isso mesmo é considerado um cão assassino, desenvolvido ao longo do tempo para se tornar imbatível em lutas contra outros cães. 

E muito embora não se possa acusá-lo de predador humano, um desvio de seu temperamento, um “defeito” no próprio instinto influenciado talvez por essa manipulação humana (por natureza, os animais só atacam quando estão com fome ou quando se sentem ameaçados) o levam, infelizmente, de forma sinistramente progressiva, a agredir as pessoas, muitas vezes seus próprios donos!Segundo especialistas, o Pit Bull, quando ouve barulho, algazarra de crianças, ruídos que não está acostumado, ele interpreta como situações hostis, tal como numa rinha de briga. Daí atacar indiscriminadamente. 

Pesquisei na Internet e transmito algumas informações científicas. Por exemplo, quando este animal morde ele trava a mandíbula, e nem o dono consegue soltar a vítima porque ele é um cão branquiocefálico (cabeça curta e larga), que tem o masseter (músculo de mastigação que movimenta a mandíbula) curto, e no desenvolver de uma mordedura rápida e com violência entra em tetania (troca de ions muito rápida), o que faz com que a mandíbula trave e não abra, fato que, ao contrário do que pensam alguns, é totalmente involuntário, inerente à natureza da raça.

O caso da menina bom-jesuense tem a agravante de o cão ter escapado de sua própria casa, sinal de que não havia o cuidado e a segurança necessários na guarda do cachorro, que pode ser considerado uma arma perigosa e, às vezes, letal. 

A negligência encontra, todavia, o beneplácito, a brandura da lei brasileira. 

Na França, quem tem um cão de raça agressiva é obrigado a registrar-se e ter um seguro para cobrir eventuais danos; 

Em diversos estados alemães só pode possuir um cachorro perigoso quem tem mais de 18 anos e nenhuma passagem na polícia; 

Na maioria dos estados americanos, quem decide criar um cão pela primeira vez não pode comprar animais como os Rottweiler, Dobermann ou Pit-Bull, ao contrário do que ocorre no Brasil. 

Lá, para adquiri-los, é necessário ser maior de idade e passar por cursos de treinamento. Só depois as autoridades concedem o registro do cão. 

Assim, percebe-se claramente o deslocamento do eixo de responsabilidade do animal para o seu proprietário, o que parece muito mais racional e eficaz no combate às agressões.
É preciso que o Brasil promova uma legislação dura com relação aos donos dos animais, para dar conta das situações em que estes efetivamente causem lesões a outras pessoas.

Nos Estados Unidos, se um cão mata, o dono é preso e condenado a até doze anos de cadeia, o mesmo acontecendo na Inglaterra e em outros países europeus. 

Em nosso país, é diferente. Em tese, o dono do cão assassino pode até ser condenado por homicídio culposo, mas isso é raro, e são também raríssimos os casos em que o dono do animal é condenado a indenizar os danos materiais (despesas com atendimento médico) e morais (a dor, o medo, os problemas psicológicos) sofridos pelas vítimas.

Nossos vereadores, por outro lado, podem e têm autonomia para criar leis e códigos municipais. 

Não precisam se envergonhar em propiciar dispositivos avançados em cidades interioranas como as nossas. 

Que tal se todos os cães bom-jesuenses, apiacaenses e calçadenses, de raças consideradas violentas ou com peso superior a 20 quilos tivessem de usar coleira, guia e focinheira em seus passeios pelas praças e ruas das cidades?

Que tal se os condutores tivessem de portar pazinhas e sacos plásticos para limpar a imundície nos logradouros públicos? 

E se esses grandalhões só pudessem ser criados em casas com muros altos, devidamente registrados e seus proprietários notificados oficialmente de suas responsabilidades? 

E o Poder Judiciário, que tal fazer cumprir a lei sem condescendência?Reportando-me ao poeta no leito da filha: “Penas cruéis assim, por que as merece?/ que mal entrando na existência vinha?". 

No caso da menininha bom-jesuense, digo eu, descaso e negligência, que aliados à omissão do Estado punitivo nos leva a temermos, a ficarmos constantemente sobressaltados pelo destino de outras crianças!

Autor: José Henrique Vaillant - Publicado em novembro/2004